sábado, 27 de novembro de 2004

Revisão da trilogia Indiana Jones

Deu mais ou menos o esperado: na revisão, Os Caçadores da Arca Perdida se confirmou como o melhor Spielberg, e Indiana Jones e o Templo da Perdição se confirmou como o mais fraco dos três. No caso, foi o que decepcionou, mais pela incapacidade em mudar o registro. Tudo é muito over, e Spielberg não sabe trabalhar assim. No terceiro, IJ e a Última Cruzada, com o tema da relação entre pai e filho, tema caro ao diretor, a coisa volta a entrar nos eixos, também porque o filme tem ritmo muito parecido com o primeiro da série. Comédia, aventura, busca por um objeto sagrado...O terceiro tem o melhor final dos três, o segundo é todo errado, mas tem grandes momentos, e por isso se salva com dignidade, e o primeiro é um modelo que afoi muito mal imitado depois.

Os extras revelaram o óbvio: as cenas que Spielberg mais gosta geralmente são as melhores mesmo (como exemplo, o olhar de Indy para o pai, após a cena com as gaivotas), o que significa que o diretor sabia muito bem o que estava fazendo (bem ao contrário do que a trilha de comentários de Frank Oz para A Cartada Final revela: um desinteresse e uma ignorância que eu não esperava em alguém que dirigiu Os Safados).

Top 10 Spielberg:

1) Os Caçadores da Arca Perdida
2) Indiana Jones e a Última Cruzada (empate técnico com os quatro de baixo, mas como vi por último...)
3) Encurralado
4) Tubarão
5) Contatos Imediatos do Terceiro Grau
6) A.I.
7) Louca Escapada
8) 1941
9) E.T.
10) Prenda-me Se For Capaz

Os 5 piores (em ordem decrescente de ruindade):

1) A Cor Púrpura
2) Amistad
3) Hook
4) O Império do Sol
5) Além da Eternidade


segunda-feira, 22 de novembro de 2004

A Morte de um Burocrata (1966)- Tomas G. Alea * * * *
Andaram falando mal do filme por aí. Humpf!!! Comédia de humor negro fenomenal, com um ritmo caótico, mas que sabe dar uma paradinha quando quer. A pista é o papel batido à máquina no início, com os agradecimentos aos autores que são homenageados por Alea. Precisava ver de novo, mas me parece que a ordem de referências é igual a ordem dos agradecidos do papel. Um filme referencial muito antes de Tarantino. Dois sonhos: o primeiro começa Buñuel e vira Bergman, o segundo começa Bergman e vira Buñuel. Realidade dura: o protagonista consegue mirar o canhão para outro lado, mas um de seus algozes volta à mira antiga...esperamos uma nova mudança...que não vem. Cachorrinho com osso na boca, grito-ambulância, homem-vampirizado sob as estátuas L'Âge D'or do início do filme. Contra-plongées e angulares Wellesianos, tudo muito rápido. Filme revolta, filme escárnio, filme bagunça, o cinema que foi e que pode ser. Alea tentaria dar forma às confusões de sua mente na próxima obra-prima (Memórias do Subdesenvolvimento, 1968). Aqui é o rascunho, de um filme-esboço, bobo, chapado, apressado, confuso, indeciso, e muito, muito talentoso.

sábado, 20 de novembro de 2004

Mais dois filmes vistos, dessa vez em circuitão: Celular e Os Esquecidos. Celular é bom como Valente e Gui tinham dito, com uma capacidade salutar de dar cutucadas sem se levar a sério, em especial à febre dos celulares como companheiros inseparáveis das pessoas. Filme a que se assiste com prazer, mesmo que tenha uma primeira metade um tanto titubeante, com algumas situações mal resolvidas, mas necessárias para levar o filme adiante. Poderiam ser melhor trabalhadas, por exemplo, a necessidade de não se desligar o telefone (o que ficou meio forçado), e a relação do herói com amigos e ex-namorada (todas as cenas iniciais com esses personagens soam equivocadas).

Os Esquecidos foi uma grata surpresa. Não era o caso de se esperar uma nulidade de Joseph Ruben (do qual só conheço três filmes uma estrela, sendo que pelo menos um - Morte nos Sonhos - quase ganha duas). Mas que o filme impressiona enquanto está sendo visto, impressiona. Não vale dizer muito, pois acho que quanto mais virgem se for ver o filme, melhor (e de resto, concordo com o Kaganski, que disse gostar de ir ao cinema com o mínimo de informação sobre o que vai ver, se der, nenhuma informação é o ideal). Indo para casa depois, fiquei pensando que poderia ser melhor, mas como nem sei bem o quê, fica valendo a impressão assim que o filme acabou: um bom filme de terror invertido. É o vilão que é mais aterrorizado.



Dois filmes vistos no ciclo de Carlão Reichenbach: 1) Extremos do Prazer, que eu não conhecia, e que infelizmente passou com vinte minutos a menos, devido ao estado da cópia. Filmaço, com Roberto Miranda dizendo frases clássicas como: “desempenhei galhardamente o meu papel de macho” (ou coisa muito parecida). A esperança é que a Stúdio X tenha o filme, tirado de uma cópia inteira. 2) Alma Corsária, cuja revisão confirmou ser uma pequena obra-prima. Um filme ET em sua época, onde boas idéias eram sacrificadas em prol da narrativa. Carlão faz justamente o contrário. O filme transborda de boas idéias, muitas vezes colidindo com o que seria uma narrativa tradicional. Um dos filmes mais apaixonados que já vi em qualquer tempo, qualquer lugar. E Sam Fuller finalmente levou o Oscar.

quarta-feira, 17 de novembro de 2004

Zatoichi – Takeshi Kitano * * *

Alguém viu Ralé, do Kurosawa? A mesma tentativa de mesclar musica, riso e ação que se encontrava lá, está muito melhor trabalhada por Kitano neste belo exemplo de cinema multi-gêneros. Se Kurosawa trabalhava muito bem a comicidade musical de seus personagens, mas se esquecia de imprimir um bom ritmo às cenas de ação, Kitano extrapola, testa os limites dessa comicidade chegando perto da fronteira do ridículo. E é esse risco evidente que torna Zatoichi um belo filme. Tenta-se o tempo todo ilustrar uma luta, mais do que mostrá-la, com efeitos hiperbólicos, propositadamente artificiais, entregando a origem mangá do filme. Lembro de ter dado muitas risadas (eu que nem sou de rir muito no cinema, rio para dentro, só eu escuto). Gargalhadas espontâneas, que se fossem proibidas sairiam do mesmo jeito. Lembrei de ralé o tempo todo. De como o filme antigo (visto na Cinemateca) poderia ser muito melhor. Zatoichi parece ser a confirmação de que Ralé poderia, mesmo, ser muito melhor. Termina com uma espécie de bloco carnavalesco, com forte percussão, como se Kitano resolvesse encerrar uma etapa de sua filmografia. É muito diferente do que se poderia esperar dele, mesmo depois de Dolls, o brilhante relato das obsessões. E deixa uma expectativa maior ainda para os filmes que virão. O que será o próximo? Um pornô-soft? Um filme de zumbis? Ou apenas mais um Kitano-movie?

Encerrando o capítulo dos filmes da Mostra, tirando alguns textos que devem pintar por aqui, aí vai o Top 10:

1) Cinco
2) O Quinto Império
3) Mal dos Trópicos
4) La Niña Santa
5) Antes do Pôr do Sol
6) Dez Sobre Dez
7) Bens Confiscados
8) Zatoichi
9) A Ferida
10) Whisky

E os piores - do pior (1) para o menos pior (10) :

1) Nina
2) Terra da Fartura
3) Conversaciones con Mamá
4) Porão
5) O Avental de Lili
6) A Oitava Cor do Arco-Iris
7) Borboleta
8) Dandelion
9) De- Lovely
10) Os Sonhadores


sábado, 13 de novembro de 2004

Filmes vistos em Outubro (depois do dia 22, todos pela Mostra SP, exceto A Fortaleza) - revisão em negrito.

Corpo Fechado - M.Night Shyamalan (DVD) * * *
Era Uma Vez no Oeste - Sergio Leone (Odeon - RIO) * * * *
Somersault - Cate Shortland (E.Unibanco 2-RIO) 0
The Woodsman - Nicole Kassell (E.Botafogo1 - RIO) *
Quando Explode a Vingança - Sergio Leone (MAM-RIO) * * * *
No Mundo de 2020 - Richard Fleischer (MAM-RIO) * *
Água Viva - Kiyoshi Kurosawa (E.Unibanco 2-RIO) * *
Casa dos Bebês - John Sayles (E.Paissandu-RIO) * *
Capitão Sky e o Mundo de Amanhã - Kerry Conran (E.Botafogo 1-RIO) *
O Coração é Traiçoeiro Acima de Todas as Coisas - Asia Argento (E.Unibanco 2-RIO) *
Undertow - David Gordon Green (E.Botafogo 1-RIO) * *
Alexandria-Nova York - Youssef Chahine (E.Unibanco1-RIO) *
Um Dia Quente de Inverno - Stéphane Vuillet (E.Unibanco1-RIO) * *
A Última Vida no Universo - Pen-ek Ratanaruang (E.Unibanco1-RIO) *
Anatomia do Inferno - Catherine Breillat (E.Unibanco1-RIO) * * *
Por Um Punhado de Dólares - Sergio Leone (E.Unibanco1-RIO) * * * *
Por Uns Dólares a Mais - Sergio Leone (DVD) * * *
Daisy Miller - Peter Bogdanovich (DVD) * * *
Ichi the Killer - Takashi Miike (VHS) * *
A Dona da História - Daniel Filho (Arteplex 3) 0
Amor à Tarde - Eric Rohmer (Top Cine 1) * * * *
Nossa Música - Jean-Luc Godard (Belas Artes-Aleijadinho) * * *
Paixão à Flor da Pele - Paul McGuigan (Bristol 5) * * *
O Templo de Shaolin - Chang Cheh (DVD) * * *
Confronto em Chinatown - Chang Cheh (DVD) *
Quem Bate à Minha Porta? - Martin Scorsese (DVD) *
Nina - Heitor Dhalia (Arteplex 9) 0
Kill Bill Vol.2 - Quentin Tarantino (Bristol 1) * * *
Viver e Morrer em L.A.- William Friedkin (DVD) * * *
Passagem Azul - Yii Chih-Yen (Cinesesc) * * *
Falstaff / Chimes at Midnight - Orson Welles (DVD) * * * *
Depois de Horas - Martin Scorsese (DVD) * * * *
O Âncora, A Lenda de Ron Burgundy - Adam McKay (Pátio Higienópolis 1) * *
A Subida da Maré - Yolande Moreau e Gilles Porte (Arteplex 1) * *
A Paisagem que Flutua - Carol Lai Miusuet (DirecTV 1) *
O Revolver Amado - Kensaku Watanabe (DirecTV 2) *
Tormento - Jonathan Caouette (E.Unibanco 1) *
Zatoichi - Takeshi Kitano (E.Unibanco 1) * * *
6 e 7 - Geno Tsaava (Cinesesc) * *
Má Educação - Pedro Almodovar (Cinesesc) * *
Cuidadoso - Guy Maddin (DirecTV1) *
A Fortaleza - Satyajit Ray (CCSP) * * *
La Niña Santa - Lucrecia Martel (Arteplex 2) * * * *
Whisky - Juan Pablo Rebello e Pablo Stoll (Arteplex 1) * * *
Crepúsculo das Ninfas de Gelo - Guy Maddin (Cinesesc) *
Contos do Hospital Gimli - Guy Maddin (Cinesesc) *
Linda Cidade - Asghar Farhadi (Cinearte 1) * *
A Oitava Cor do Arco-Iris - Amauri Tangará (DirecTV1) 0
Porão - Eric Werthman (DirecTV1) 0
Esther - Amos Gitai (Arteplex 2) * * *
Mate Seus Ídolos - Scott Crary (Arteplex 2) *
O Avental de Lili - Mariano Galperin (Arteplex 2) 0
Diário de Campanha - Amos Gitai (Arteplex 1) *
20 Dedos - Mania Akbari (Arteplex 2) *
A Vida Continua - Abbas Kiarostami (Cinesesc) * * * *
Familia Rodante - Pablo Trapero (DirecTV1) * *
Borboleta - Yan Yan Mak (DirecTV1) 0
Dez Sobre Dez - Abbas Kiarostami (Cinesesc) * * * *
Cinco - Abbas Kiarostami (Cinesesc) * * * *
Luzes Vermelhas - Cedric Kahn (Arteplex 2) * *
Eden - Amos Gitai (Cinesesc) *
Berlim Jerusalem - Amos Gitai (Cinesesc) * * *
Memória del Saqueo - Fernando Solanas (E.Unibanco 1) * *
Um Dia Depois do Outro - Amos Gitai (DirecTV2) *
Los Muertos - Lisandro Alonso (Cinesesc) *
Bens Confiscados - Carlos Reichenbach (Arteplex 2) * * *
O Jogador de Cartas - Dario Argento (Arteplex 1) * *
5x2 - François Ozon (Arteplex 1) *
O Quinto Império - Manoel de Oliveira (Arteplex 1) * * * *
Oh, Homem - Yervant Gianakian e Angela Ricci Lucchi (DirecTV2) * *
Sangre - Pablo Cesar (Cinearte 1) * *
Old Boy - Chan-wook Park (E.Unibanco1) * *

quarta-feira, 10 de novembro de 2004

Filmes vistos na repescagem:

Conversaciones com Mamá – Santiago Carlos Oves 0
Devo fazer pílula dessa bomba para a Contracampo.

De-Lovely – Irwin Winkler 0
Devo fazer texto dessa tentativa de hagiografia de Cole Porter para a Contracampo.

Terra da Fartura – Wim Wenders 0
Até os cinco minutos finais, o filme estava fraco, com cada plano se arrastando sem o menor sentido, mas com alguma dignidade. Depois torna-se um dos filmes mais idiotas já feitos, com direito a perseguição de uma bandeira americana e um diálogo com valor cinematográfico negativo. Prova definitiva de que Wenders ficou gagá.

Os Sonhadores – Bernardo Bertolucci *
O diretor sonhou em fazer um retrato cinefilico de maio de 1968, mas caiu nas concessões de praxe, com citações mais do que didáticas, simplistas mesmo, e resoluções dramatúrgicas de quinta. Tenta chocar, mas nunca vai a fundo. É um falso subversivo, sem talento para, de outra forma, fazer seguir com classe sua pobre narrativa.

Visões da Europa – vários diretores 0
Um grande episódio: Prólogo, de Bèla Tarr. Alguns poucos simpáticos (os de Tony Gatlif, Fatih Akin, Aki Kaurismaki) e uma imensa maioria francamente dispensável, sendo condescendente.

Feminices – Domingos de Oliveira * * *
Saborosa investigação acerca da feminilidade. Ele filma, e finge se interessar pelas mulheres de quarenta, mas está falando de todas as mulheres, como fica claro em alguns depoimentos e na própria confusão do personagem com a idade das mulheres na peça que está sendo escrita dentro do filme. Cansa um pouco na metade final, a partir da superexposição aos efeitos buscados por Domingos. Ainda assim é um belo filme, no mesmo nível atingido por Amores e Separações.

sábado, 6 de novembro de 2004

Filmes do dia 4/nov

Nos Campos de Batalha – Danielle Arbid *

Quando centra-se na amizade de duas quase irmãs, uma no início, outra no final da adolescência, na mais nova testemunhando os rolos amorosos da mais velha, dos passeios e paqueras o filme é bem agradável de se ver. O problema é quando resolve mostrar um pai autoritário e brutamontes, no alto de sua ignorância (em determinado momento ele mata um cachorro). O diretor ainda coloca os famosos clipes, onde uma canção embala uma série de acontecimentos mostrados em resumo, o que dá um agradável respiro, mas não ajuda o filme a ser mais do que um simpático e frustrante pedaço de bom cinema. Visto no DirecTV 1.

Bem me Quer, Mal me Quer – Maria de Medeiros *
Muito bom de se ver, ainda que mal editado, mas também seria muita incompetência fazer um filme desses sem deixá-lo no mínimo interessante. Um filme que deve ser visto, pelo que se discute dentro dele, não por qualquer mérito da diretora. Visto no DirecTV.

Maria Cheia de Graça – Joshua Marston *
Confesso que me escapa o porquê do encanto que esse filme tem despertado. Direitinho, cheio de concessões dramatúrgicas e uma baboseira tremenda em dar conotações religiosas à saga da imigrante ilegal por acidente. Visto no DirecTV 1.

De agora em diante, pretendo comentar os filmes que for vendo em repescagem, e as revisões, como a de Mal dos Trópicos (surpreendentemente votado como o melhor da Mostra pela crítica), que apesar da projeção medonha do Cinearte 1, confirmou-se como obra-prima máxima. Já o filme do Trapero, também revisto, continuou na mesma.

quinta-feira, 4 de novembro de 2004

Filmes do dia 3/nov

Caçados por Sonhos – Buddhadeb Dasgupta * *
Um belo filme, prejudicado por um imenso sono que me arrebatou durante sua metade final. Dois planos se destacam: o plano final, filmado como um reencontro místico; e o plano da dança das sombras numa tela improvisada de cinema. Visto em uma constante luta contra o sono no Esp. Unibanco 1.

Bem-vindo a São Paulo – vários diretores *
Irregular à beça, mas com seus momentos. Espera-se que a estrutura um tanto confussa seja melhorada na cópia definitiva. Destaques para os episódios de Tsai Ming-Liang, de Daniela Thomas e de Wolfgang Becker. Visto com o som incrivelmente ruim do Cinearte 1.

Terra Prometida – Amos Gitai *
Filmado em digital, o que explica a claudicância (êta palavra estranha) de sua mise-en-scène. Tem seus momentos, mas também exagera na falta de tom, pegando pesado em alguns momentos (o do felatio forçado, por exemplo). Mas o final é bonito, com a tragédia sendo ofuscada pela liberdade das moças. Visto no Arteplex 1.

Sobre o próximo filme, último do dia, visto às 23h no Arteplex 2, é necessária uma resposta aos amigos contracampistas, que odiaram o filme em bloco:

Por que Noiva das Trevas (de William Wai Lun Kwok * *) está longe de ser bola preta:

- porque é um filme de terror infantil, com adultos interpretando papéis de crianças, por isso não faz sentido atacar as atuações, propositadamente infantilizadas. Achei que fossem idiotas ao final da projeção, mas depois a ficha caiu: são mesmo crianças aprisionadas em corpos adultos, o que por si só já é um elemento de terror. Temos o menino tímido e que se tornará homossexual, temos a menina saidinha, que gosta de brincar de médico com dois meninos, um deles (Sissi) o amiguinho querido, o outro sendo aquele durão que enfrentava os muleques da turma da rua de cima (no filme, os gangsters), e que desperta o lado mais sensual da menina, em sua pré-puberdade. O uso da trilha explica o porquê de se intuir o sobrenatural, como as crianças imaginam um monstro debaixo da cama, ou a espreita atrás de uma porta. Tem até ranger de móveis, fator sempre amedrontador em crianças.

- porque faz um comentário, por vezes equivocado, mas muito interessante dos experimentos do "filme de arte" (por favor, leiam as áspas), desde Tarkovski (de quem o diretor William Kwok chupou descaradamente A Infância de Ivan no plano final). Mas as citações não param aí: Kwaidan, do Kobayashi; Eros+Massacre, do Yoshida; Lola Montés, do Ophuls (e quem disser que estou viajando, lembre-se que freqüentemente há algo vermelho em foco, deixando tudo mais desfocado - não é uma citação direta, mas uma homenagem, já que Ophuls usa muito vermelho em Lola, e sempre coloca um objeto em primeiro plano, entre a lente e o rosto dos atores). Bom...eu disse que nem sempre essas citações funcionam...

- porque tem bons enquadramentos, sim, apesar de alguns clichês de "cinema de arte".

-sobre a falta de foco, ainda não sei se foi por causa da cópia mal tirada ou da opção ophulsiana (já mencionada dois tópicos acima) elevada ao extremo.

Por que está longe de ser 4 estrelas:

- porque é mal decupado à beça, com cortes sempre precipitados, e tem vários momentos em que o diretor não tem a menor idéia de como desenvolver a rasa trama que tem em mãos.

quarta-feira, 3 de novembro de 2004

Filmes do dia 2/nov

Mal dos Trópicos – Apichatpong Weerasethakul * * *
Uma pena que um filme desses, de deixar qualquer espectador de verdade atordoado, tenha sido sabotado por um monte de gente que insiste em entrar no filme quinze minutos depois do início da sessão. Depois, um demente ficava fazendo barulho com uma sacola, e não adiantava reclamar que ele fazia mais. Como não queria cometer assassinato, acabei tentando abstrair a irritação. O filme? Um dos filmes com trechos dos mais maravilhosos do ano, mas falta um pequeno tanto pra ser obra-prima. Visto no Arteplex 1, com vários contracampistas, e várias pessoas desinteressadas.

Chapéu Verde – first film by Liu Fendou * *
Uma bizarrice com mudança duas mudanças de tom, ambas bem interessantes. Perde-se um pouco na tentativa de levar o espectador em uma direção específica, quando na verdade vai por outra. Chega um momento que esse artifício cansa. Mas é um filme a ser visto. Esp. Unibanco 1.

A Ferida – Nicolas Klotz * * *
Só a cena do casal sorrindo no metrô, com um princípio de adequação ao lugar, já vale o filme. Mas tem muito mais: na câmera quase sempre estática, no tempo do filme se adequando ao tempo dos personagens, no tratamento maduro do problema da imigração e seus efeitos. Faltou, talvez, uma maior contextualização do porquê da truculência policial, mas nem sei se isso pode ser considerado uma falha, já que a câmera está o tempo todo do lado dos exilados. Filme visto na poltrona massacrante do MIS.

terça-feira, 2 de novembro de 2004

Filmes do dia 1/nov

Passagens - Yang Chao * *
O tipo do filme do qual se espera mais pela simples constatação da proposta nos minutos iniciais. Você fica instigado pra ver onde vai dar tudo aquilo, com uma trama esvaziada interessantemente pela opção do diretor em trabalhar com os sentidos, explorando a paisagem como dúvida existencial dos personagens. O problema é que eu não estava à altura de conferir se o filme vai ou não muito longe. Estava com muito sono. Lutei pra não dormir no Arteplex 2.

Ouro Carmim - Jafar Panahi * *
Uma maravilhosa abertura, com belo tratamento do off screen. Depois o filme se torna modorrento em algumas partes, apesar da percepção de que algo de muito profundo está sendo analisado. Um filme com muito potencial, que Panahi não soube aproveitar completamente. Visto na Sala UOL.

Dandelion - Mark Milgard 0
Um festival de clichês, com uma trilha bacana (Sparklehorse, Cat Power...) e imagens que se pretendem profundas, mas que pela falta de originalidade afundam o filme ainda mais. Típico filme independente americano onde as intenções são muito mal trabalhadas, atrapalhando o possível trunfo do filme. Visto na UOL.

Depois teve a revisão do genial O Quinto Império, também na Sala UOL. Volto a ele quando a mostra terminar.

segunda-feira, 1 de novembro de 2004

Mostra SP – filmes de sábado e domingo, dias 30 e 31 de outubro

5x2 – François Ozon *
Ozon consegue alguns momentos de interesse, principalmente nos episódios 2 e 5 (curiosamente os dois números do título). Mas os outros padecem do mal de Ozon, no qual a câmera parece mais desinteressada, e o diretor busca efeitos mais poéticos com menos entrega aos personagens. Visto no Arteplex 1.

O Quinto Império – Manoel de Oliveira * * * *
A segunda obra-prima absoluta da Mostra (Cinco foi a primeira, as outras eram pequenas obras-primas). A perfeita simetria de seus enquadramentos, o tempo certo do corte, a maestria na movimentação quase inexistente da câmera - ela está o tempo todo estática, mas quando resolve se mexer, muito discretamente, quase imperceptível, o movimento é genial – são coisas que tornam a definição “teatro filmado” um absurdo. Visto em seqüência no Arteplex 1, antes de apertos de mão do bom velhinho e dois minutos de sua sabedoria no hall do Frei Caneca.

(domingo de eleição)

Oh, Homem – Yervant Gianakian e Angela Ricci Lucchi * *
Documentário sobre a primeira guerra que lembra o cinema de Pelechian. A pesquisa de imagens e a montagem, que mostra as atrocidades num crescendo que busca o questionamento, são os maiores trunfos de um filme forte e que deve ser visto. Primeira sessão do domingo, já às 18:10, no DirecTV 2, onde encontro com várias pessoas, incluindo Inácio Araújo, Ruy Gardnier e Eduardo Valente, que gostaram do filme Um Dia Depois do Outro, do Gitai.

Sangre – Pablo Cesar * *
Um jeitão de filme esboço, com ações que parecem não encenadas, e momentos muito bons de poesia, que chega pela construção, não pela imposição. Filme que mostra personagens problemáticos, que chegam perto da escuridão, mas acabam por procurar a luz. Um belíssimo plano final. Visto no Cinearte 1, com um som horroroso, que deve ter feito o diretor morrer de vergonha.

Old Boy – Chan-wook Park * *
OK, o filme tem vários momentos de ruindade. Mas seus grandes momentos, e até quem não gostou do filme os reconhece, foram o suficiente pra mim. O bom uso do scope e da música, que o Chiko achou irritante (e respeito a opiniáo dele), além da esperteza do diretor em usar e abusar de artifícios do cinema cult oriental, fazem do filme uma peça irregular, mas tocante de cinema para sábado a noite, se é que isso existe. Wong Kar-Wai com Takashi Miike, ainda que seja a diluição dos dois. Visto no Esp.Unibanco 1.