sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Ontem fui conferir Meu Nome Não é Johnny, numa sala menor do Arteplex, que, diferentemente de todo o ano passado, estava bem cheia e ruidosa - o que me fez ver que há pelo menos uma vantagem na escassez de público dos cinemas. Esperava que não fosse tão ruim quanto o que disseram, mas encontrei um filme no mínimo simpático, com a que talvez seja a melhor interpretação do Selton Mello no cinema, no papel de João Guilherme, o mauricinho que resolve viver a vida à sua maneira mais hedonista, sem se preocupar com os meios financeiros para conseguir isso.

O filme de Mauro Lima é muito feliz especialmente na maneira com que faz coincidir a alienação do personagem com a do público (que pouco sabe além do que o personagem sabe). Nesse sentido, me pareceram problemáticas todas as cenas que se afastam do homem que nao é Johnny, mas João. Até sua prisão, essas cenas se limitavam a um flash de máquina fotográfica indicando que alguém o vigiava - um clichê do cinema, e a um ou outro comentário paralelo de amigos dele. Ainda assim, existe uma habilidade surpreendente na dramaturgia, no naturalismo dos xavecos e broncas dos personagens, nas gírias que pipocam por todo o filme. João não fala a gíria carioca da época (essencialmente anos 80, mas também começo dos anos 90), mas o que importa? Ele fala a gíria dele, uma mistura da que já existia com a que ele popularizava entre seus amigos. A dedicação do ator ao personagem é o maior trunfo do filme.

Depois da prisão, os problemas passam a se tornar mais freqüentes, geralmente nesse sentido de se afastar do protagonista, e uma das personagens mais problemáticas é a da juíza interpretada por Cássia Kiss, tida como linha dura, mas que na verdade é uma pretensa mãe, que se condoia de ver o bebêzinho Johnson (não Johnny) ali chorando na frente dela no tribunal. Mas quando mostra a casa dela fica evidente que o diretor não é bobo, já que a sala é muito parecida com a da casa dos pais de João, e é filmada da mesma maneira, com a câmera do lado de fora de um enorme vitrô. Pode ser simples coincidência, ou falta de criatividade na hora de planejar as cenas, mas não creio.

Acho bobeira entrar no assunto de que o cara é branco, bem nascido, e por isso teria melhores condições de se sair dessa situação humilhante. Isso é óbvio, e o cinema não tem obrigação alguma de trair a obviedade. Teria, sim, uma obrigação de fugir da explicação tematizante tosca como a frase da juíza (que aparece escrita no final do filme) falando da prova de que é possível recuperar um ser humano, porque aí existe uma implicação a mais que o filme parece ignorar, a de que o entorno social conta para que essa recuperação seja possível. No mais, toda a seqüência de João na prisão é bem decente, e não há condescendência com ele, a não ser na cena da surra do japonês. Já no hospício a coisa volta a desandar. Ainda bem que dura pouco. Um filme bem digno, apesar desses problemas. Entre duas e três estrelas, no padrão Paisà. Vamos ver para qual lado vai com o passar dos dias.