quarta-feira, 18 de agosto de 2004

Achei este texto no meio dos meus arquivos. Pela data, acho que o escrevi pensando no texto enorme sobre ele para a Contracampo. Não sei por que abandonei essa linha, bem diferente da que acabei tomando. Talvez o texto ficasse melhor...

DAVID CRONENBERG

Cronenberg é filho de maio. Nasceu no dia 15, ano de 1943, auge da Segunda Guerra Mundial. Sua inspiração é norteada pelos ventos frios da primavera do hemisfério norte. Sua cidade natal, Toronto, queria pertencer aos Estados Unidos, dada a extrema voluptuosidade de sua cultura. Seu cinema parece apátrido, quando não toca no cerne da dualidade inglês-francês de seu país. Não é a toa que alguns de seus filmes, especialmente os primeiros, sejam ambientados em Quebec, onde a língua francesa se impõe. Cronenberg gosta da ambigüidade. Sente-se bem no território do "será que é isso mesmo" no qual seus filmes habitam. Falando em língua francesa, o médico de nome francês (Saint-Luc) de Calafrios, responsável pela saúde dos moradores de um condomínio numa ilha no Canadá francês, irrita-se com o casal de idosos que mal entendem seu inglês. Parece haver aí uma zombaria com a condição de Quebec de oásis francófono. Mas essa dispersão só seria possível até seu terceiro filme. À partir de Rabid (1977), seu cinema torna-se obsessivo e técnico, com uma frieza peculiar, como a de um cientista maluco que acredita ter a fórmula do melhor viver. Por isso a ciência está sempre presente em seus filmes, invariavelmente e acintosamente como propulsora de males involuntários que colocam o ser humano em risco. Mas o que é ser humano para Cronenberg?