segunda-feira, 10 de maio de 2004

O Pântano (2001) - Lucrecia Martel * * * *
Antes da revisão, impressiona a sensibilidade da diretora para retratar crianças e adolescentes fugindo da vala comum. Luciano, o menino, fantasia que o cachorro do vizinho é, na verdade, uma enorme ratazana africana. Ela nunca filma o cachorro, deixando sua imagem apenas na imaginação. As meninas cantando na frente de um ventilador, com suas vozes chegando antes, em off, antes do movimento que revela onde elas estão. Só por essa cena o filme já merece ser visto por todos que prezam o cinema como forma de poesia. Aliás, ainda não vi o novo do Waltinho, nem tenho por seus filmes a mesma indiferença que meus amigos da Contracampo, mas o que diferencia Salles de Martel é que Salles, como cinéfilo, sabe em que momento seus filmes atingirão a poesia e constrói planos buscando esse efeito. Martel faz poesia pela simples sensibilidade de seu trato com os personagens, por sua entrega, e recusa em cair em maniqueísmos fáceis. Quem é preconceituoso não é necessariamente ruim. Seus humanos sofrem, maltratam, amam, odeiam, se calam, são relapsos, mas são demasiadamente humanos. Vistos por alguém que lhes tem compaixão, não julga, não absolve, apenas procura entendê-los.