quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Vendo Satantango, de Béla Tarr, cineasta que usa e abusa do plano-seqüência - inclusive um no qual uma menina tortura um gato -, fiquei pensando na função prática de tal opção. Durante o Festival do Rio, na saída do novo filme de Joe Wright, Desejo e Reparação, amigos contracampistas reclamavam da segunda parte do filme, sobre a qual concordo em parte que é inferior à primeira, e do plano seqüência exibicionista da praia, que não me incomodou, pelo contrário, mas que incomodou a muitos deles (se não me engano, só o Ruy se manifestou favoravelmente a ele, no diário da redação).

Aí, no dia seguinte, encontrei um amigo muito inteligente que estava vendo um filme por dia no festival, e não se considera cinéfilo (sem que isso tenha a ver com a inteligência dele, pelamordedeus). Ele me disse que havia gostado do filme do Wright, e eu perguntei se o plano-seqüência havia o incomodado. Ele não se lembrava de ter visto um no filme, ao que eu respondi dizendo ser o da praia, quando uma steady-cam acompanha o protagonista enquanto ele observa as conseqüências de uma batalha. Ele disse que havia gostado muito dessa cena, e que se sentiu cúmplice do personagem no sentimento diante das atrocidades.

O que quero dizer é que talvez um plano-seqüência possa ser exibicionista e desnecessário para nós, críticos, viciados em reparar na linguagem do cinema, mas não para o espectador comum, que constitui 99% do público que vai ao cinema. Logo, não foi apenas exibicionismo, mas sim um importante recurso. Podemos questionar a opção por esse recurso, e a forma como ele foi usado, mas não podemos dizer que foi inútil, ou puramente gratuito. Ou até podemos, mas estaríamos numa seara completamente subjetiva. Bem diferente é a discussão que Rivette iniciou com o travelling de Kapó, de Gillo Pontecorvo, mas essa é outra história (sobre o que e como mostrar, e não sobre como situar melhor o espectador em determinada ambiência).