quarta-feira, 30 de março de 2005

O Casamento de Romeu e Julieta está bem longe de ser um filme ruim. Bruno Barreto tem pleno controle do que pode funcionar numa chave cômica, como nas interpretações de Berta Zemmel, Luis Gustavo e Marco Ricca, e acerta em cheio nas situações de fanatismo das duas torcidas. Soube colocar na tela o clima de paixão exacerbada que envolve o clássico Corinthians X Palmeiras. Soube, acima de tudo, sair com dignidade da armadilha do se levar a sério, como a cena da igreja, com o lado do noivo desenrolando uma bandeira gigante do Corinthians e o mesmo acontecendo do outro lado, obviamente com uma bandeira do Palmeiras. O que ameaçava cair na pieguice da união entre rivais tomou o inverossímil e delicioso caminho do sarcasmo. Fora alguns trechos realmente engraçados como a obrigação de se cantar o hino do time rival, a necessidade de esconder a felicidade quando o Manchester United fez o gol na final mundial, a inteligência de alguns cortes, que privilegiam o tempo da piada. Tem momentos ruins, como no barraco armado na quadra do prédio, ou nas aparições equivocadas e desnecessárias da personagem de Mel Lisboa. Mas no geral me surpreendeu.

terça-feira, 29 de março de 2005

Reencarnação, de Jonathan Glazer, é de fato um bom filme, apesar de cair na segunda metade. Danny Huston está sempre com aquele sorriso zombeteiro, mas faz o personagem mais frágil, pois não tem a menor noção de como lidar com o problema da noiva. O tal close em Nicole Kidman, durante o concerto, é mesmo excelente, mas gosto muito do plano anterior, com a câmera seguindo Nicole até o elevador e passando para Danny Huston. Um belo e discreto movimento nos situa no desespero de ambos (e na diferença com que ambos lidam com esse desespero - ele disfarçando, ela perto do choque), ponto alto do filme. Gosto de quando ele procura evitar o campo-contracampo, menos por achar isso nobre do que por simpatizar com as tentativas. Um belo exemplo é quando o menino invade o aniversário da mãe de Nicole, quando a câmera fica só nos que reagem àquela presença sinistra. O final no mar é muito belo também, retomando um andamento estranho que o filme havia perdido na segunda parte. Só não sei o que achar da personagem da Anne Heche. Gosto dela no começo, com uma câmera lenta muito bem utilizada, e seguindo-a pelo saguão do prédio. E a seqüência em que ela aterroriza o menino é boa no papel (ou seja, a idéia é boa), mas não foi tão bem realizada. Em todo caso, descoberta de Sexy Beast se torna necessária.

segunda-feira, 28 de março de 2005

Seção Expectativas (de filmes que ainda não vi, mas devo ver nos próximos dias):

- Reencarnação - alguns na contracampo gostaram, outros não. Pelo trailer, sem ter visto o filme anterior do diretor, espero um filme de mediano a razoável.

- O Casamento de Romeu e Julieta - acho Bossa Nova simpático, e a idéia por trás de Casamento bem interessante. Apesar de notar que pelo trailer deve ter muita patacoada de quem não entende a paixão do futebol, espero um filme bem longe do desprezível.

- Herói - Gosto de Zhang Yimou até Tempos de Viver. Depois o cinema dele desandou, com filmes piegas e mal decupados como Nenhum a Menos e O Caminho para Casa. Não me incomodo com beleza vazia, mas não espero muito se a preocupação for só essa.

- O Chamado 2 - Hideo Nakata é a nova coqueluche. Sou facinho para esse tipo de cinema que quer assustar, mas na hora de pensar se gostei, fica tudo mais complicado. O diretor se disse preocupado em fazer sucesso nos EUA, por isso caprichou nos sustos e deixou de lado a atmosfera. Uma grande pena, mas pode até ser passável.

- O Principe da Cidade - Tenho que rever alguns Lumet para um texto da Contracampo. Tive uma relação de gangorra com esse diretor. Antes, achava um diretor meio sem sal que de vez em quando acertava. Quando descobri esse filme, revi alguns e descobri outros tantos, e comecei a gostar mais, bem mais de Lumet. Agora, a série de revisões começou com Até os Deuses Erram, que caiu um pouco, e Serpico, que continuo achando apenas bom. Revisão em VHS é uma calamidade, mas fazer o quê?

- vários filmes de John Cassavetes - Amigos próximos que adoram, a meu ver de uma maneira que pode ser meio cega, o cinema dele poderiam condicionar minhas impressões, negativamente, como forma de compensação. Mas como esses filmes eu quero muito ver há pelo menos dez anos e nunca consegui, essa vontade, que pode ser também influenciadora, deve falar mais alto. Shadows já se saiu muito bem.

quarta-feira, 23 de março de 2005

Vendo Confidências Muito Íntimas percebo pelo menos um trunfo de Patrice Leconte: a direção de atores. Sandrine Bonnaire é uma das grandes atrizes francesas, então dirigí-la não é tão difícil assim. Mas conter Fabrice Lucchini é uma proeza, e ele está muito bem no filme. Mas Leconte insiste em deixar tudo numa superfície meio jocosa, destinada ao circuito de arte, ao invés de penetrar nas possibilidades de ousadia que o roteiro lhe abria. Ele se mostra muito mais disposto a criar pequenos alívios cômicos como a constrangedora dança de Lucchini no corredor de seu apartamento comercial do que em criar uma atmosfera de suspense, o que ele ameaça fazer até certo ponto. Não soube explorar o olhar de Bonnaire, e isso é uma falha grave. Restam as atuações, com uma direção que se fosse burocrática seria melhor.

retrô Patrice Leconte (com os filmes que vi):

Ma Femme s'Apelle Reviens (1982) * *
Um Homem Muito Esquisito (Monsieur Hire) (1988) * * *
O Marido da Cabeleireira (1989) * *
Tango (1992) * *
O Perfume de Yvonne (1994) *
Os Canastrões (1996) *
Caindo no Ridículo (1996) *
A Viúva de Saint Pierre (1999) 0
A Mulher e o Atirador de Facas (1999) * *
Confidências Muito Intimas (2004) *

segunda-feira, 21 de março de 2005

Pode ter sido sono ou até uma expectativa muito alta (pelo elenco), mas Dias Incríveis não passa do razoável. E por causa da incompetência de Todd Phillips.

Em compensação, O Fator Humano é mesmo uma maravilha. Só de pensar na última cena do último filme do Preminger, dá vontade de chorar.

sexta-feira, 18 de março de 2005

Muitos filmes vistos sem sequer uma linha de comentário. Então, vamos lá.

- India Song é impressionante. Lembra Fassbinder (pelo uso marcadamente artificial dos atores), principalmente Roleta Chinesa; e Marienbad, pelo lado lúdico que invade cada cena. Mas tem um algo a mais quando ela (Duras) se detem nos objetos e na arquitetura dos lugares. Filme pra rever, até porque vi com muito sono e, se consegui evitar alguns cochilos o preço foi a dispersão em alguns momentos. Ainda estou em dúvida se é três ou quatro estrelas, mas vai acabar sendo quatro. E quem não gosta de filme datado deve passar longe.

- Revisão de John Landis pensando em alguma idéia pra um texto mais geral na Contracampo. Resultado: não tive idéia alguma, Trocando as Bolas se tornou o único filme de Landis até agora a cair numa revisão (de nota 8 pra 7,5 - o suficiente pra baixar uma estrela...hehe). E Um Principe em NY subiu um pouco (de nota 8 pra 8,5). Os dois são muito mais dependentes do roteiro do que o habitual do diretor, principalmente Trocando as Bolas, que tem um roteiro bem capenga que ele não sabe disfarçar muito bem.

- Assassinato por Encomenda, de Michael Ritchie, tem belos momentos, mas deixa um sabor de decepção no final. Algumas piadas são muito bobocas, e aquela trilha horrenda irrita muito.

- Hora de Voltar é um apanhado de clichês do cinema independente americano por um diretor que sabe filmar, mas insiste sempre em buscar à forceps uma poesia ingênua, que teve seu lugar nos anos 80. Mais um plano em plongée com o ventilador funcionando lentamente, portanto não ventilando, em destaque. Momento lamentável de um filme medíocre.

- Se a leitura certa para Constantine, como andei lendo por aí, fosse a de um filme sobre a descoberta dos bons sentimentos pela parábola do vício em nicotina que se encerra, seria o pior filme do mundo. Como não é...e eu sei lá o que quer que seja, o filme é apenas fraquinho, com alguns momentos empolgantes, muito mais por conta do tema céu versus inferno do que por qualquer grande sacada de direção.

quinta-feira, 17 de março de 2005

A diferença entre Caminho sem Volta e Little Odessa, numa visão desatenta, é a presença de Mark Whalberg no primeiro, e de Tim Roth no segundo. Não é bem assim, mas os atores de certa forma imprimem um ritmo diferente em cada filme. Little Odessa tem muito mais peso trágico. O que faltou a Caminho sem Volta foi um rigor que transformasse o dilema de Whalberg em algo crível, já que o ator depende muito de como o diretor aproveita sua inexpressividade. Foi assim como F. Gary Gray e com Tim Burton. James Gray não soube aproveitar sua cara de rapper fora dágua. Não é o que acontece em Little Odessa. E por mais que o filme carregue nas cores e filtros (o filme puxa para o sépia, a não ser quando o irmão interpretado por Furlong aparece sozinho, aí o filme adquire cores mais frias), o trabalho de Gray é notável, principalmente por conseguir a atmosfera necessária ao drama familiar que se desenvolve. O que se nota, acima de tudo, é que são filmes de um mesmo diretor, e de que ele tem algo a dizer.

quinta-feira, 10 de março de 2005

Top 10 Buñuel

1) O Anjo Exterminador
2) Ensaio de um Crime
3) El (O Alucinado)
4) O Discreto Charme da Burguesia
5) Viridiana
6) A Via Láctea
7) L'Âge D'or
8) Os Esquecidos
9) Simão do Deserto
10) O Fantasma da Liberdade

todos * * * *.

quarta-feira, 9 de março de 2005

O Amigo Oculto mostra duas coisas: que o diretor John Polson, quando quer, cria belos planos, como no início, com a criança no giratório e na homenagem ao A Filha de Frankenstein, já no final do filme. E que essa mania de colocar uma virada radical e inesperada na trama já encehu o saco. O trabalho dele com os clichês dá pro gasto até a revelação do antagonista (que era tão óbvia que deixava uma quase certeza de que não seria confirmada... mas foi, infelizmente). Aí se perde a boa possibilidade do filme para se entrar no território fácil dos sustos, gritos e caretas. Os clichês começam a incomodar, e mesmo quando a sensação de que fomos enganados se desfaz parcialmente com o plano final, ficamos com uma forte impressão de que Polson se preocupou muito mais em valorizar o maldito truque de roteiro do que a relação pai e filha que ameaçava se tornar interessante. Nos quinze minutos finais, até as boas idéias depõem contra o filme.

terça-feira, 8 de março de 2005

Bunny Lake is Missing, de Otto Preminger = obra-prima. Nada menos que isso. Pra começar, Preminger conseguiu deixar Laurence Olivier contido, quase minimalista. Proeza que valeu ao ator uma de suas melhores atuações. E Olivier, sério, olhando atentamente o aparelho de TV que passa um show do Zombies (banda que estava estourando naquele ano, 1965), diz muito sobre a vontade do diretor em entender o que estava acontecendo na Londres maluca de meados dos anos 60. Zombies faz parte da segunda onda da "british invasion", boom de bandas inglesas que estouraram nos EUA. No filme, é o ambiente dos pubs que invade a classe média conservadora britânica. Olivier observa tudo com imensa vontade de apreender tudo aquilo. É um dos melhores usos do scope em todos os tempos, mas isso não é surpresa.

terça-feira, 1 de março de 2005

Fevereiro fraquinho fraquinho, com poucos filmes vistos. Bem...pelo menos teve Clint e Scorsese. Lasermania volta em março...o mês promete. (revisões em negrito)

A Dama de Preto - Samuel Fuller (VHS) * * * *
Ódio Contra Ódio - Joseph H.Lewis (VHS) * * * *
Menina de Ouro - Clint Eastwood (Arteplex 2) * * * *
O Massacre da Serra Elétrica - Marcus Nispel (Arteplex 1) 0
Nossa Música - Jean-Luc Godard (Cinesesc) * * *
Em Busca da Terra do Nunca - Marc Forster (Beira Mar 3/Floripa) 0
O Filho de Chucky - Don Mancini (Itaguaçu 3/Floripa) * *
Menina de Ouro - Clint Eastwood (Arteplex 2) * * * *
O Despertar da Besta - José Mojica Marins (DVD) * * * *

O Aviador - Martin Scorsese (Bristol 1) * * * *
O Massacre da Serra Elétrica - Tobe Hooper (DVD) * *
Sideways - Alexander Payne (Arteplex 7) *
Charisma - Kiyoshi Kurosawa (VHS) * * * *
Velozes e Furiosos - Rob Cohen (DVD) * *
Eterno Amor - Jean-Pierre Jeunet (Arteplex 1) 0
Ray - Taylor Hackford (Bristol 3) * *
Hitch, Conselheiro Amoroso- Andy Tennant (Bristol 2) *
Jogos Mortais - James Wan (Arteplex 8) 0
Josey Wales, O Fora da Lei - Clint Eastwood (DVD) * * * *

Jogos Mortais é um filme débil. Não se trata de desprezar as características modestas da produção. Nem de reagir a um incômodo estilo de montagem de planos curtíssimos, alternando com câmera trêmula, menos para deixar de situar o espectador, criando uma sensação claustrofóbica e mais para acentuar uma limitação em construir um jogo em que poderíamos crere nos envolver. Um filme que se propõe a construir sua trama ao redor de diversas regras impostas pelo antagonista deveria ter um roteiro mais cuidado. É muita inconsequência, o que anula a surpresa final, que poderia até funcionar, fosse Wan capaz de utilizar o péssimo roteiro a seu favor. Como? Deixando de ser refém das várias incongruências da trama e apostando numa criação de atmosfera para acentuar o desespero dos prisioneiros. Quando cai no erro de querer justificar o porquê de alguém estar naquela situação de vida ou morte, as coisas pioram ainda mais. Chega-se a justificar o comportamento doentio do serial killer de maneira canhestra, como se ele fosse uma cobaia de uma experiência errada. Não gosto muito de escrever sobre filmes que não gostei nem um pouco, mas este blog é, antes de tudo, um exercício, e como tal deve ser encarado. Posso achar tudo isso uma bobagem amanhã, ou daqui a pouco, mas gosto da idéia de registrar um fluxo leviano de pensamento.